quarta-feira, 25 de dezembro de 2024

Mil Faces de Um RPGista - The Wretched - O Engenheiro

Jogo: The Wretched
Sistema: Wretched & Alone
Autoria: Chris Bissette
Editora: Sealed Library
Experiência: Li o livro enquanto fazia esse post.
Livros usados: o básico que pode ser encontrado em sealedlibrary.itch.io/wretched-alone-srd

Reorganizei minhas postagens porque percebi que esse será o último personagem postado de 2024 e eu quero continuar a tradição iniciada na virada do ano passado de terminar o ano com o último personagem da milha lista de “em breve” e começar o ano com o primeiro dessa lista.
The Wretched é um RPG solo, ou um “journaling game”, algo como um jogo de diário. Algumas pessoas questionam onde está o role-playing nesse tipo de jogo. Pode-se dizer que seja exatamente na hora de escrever o diário como seu personagem. No caso de The Wretched, especificamente, você joga como o último sobrevivente de um cargueiro espacial que foi atacado por uma criatura ALIENígena. Você conseguiu colocar a criatura para fora, para o espaço, mas tem certeza que ela está ainda lá fora. Agora você está sozinho tentando conserta o sistema de propulsão da nave ou a antena de comunicação para pedir socorro… que pode chegar tarde demais.
É um jogo pesado e agonizante.
Ele usa um d6 (que eu achei completamente desnecessário), um baralho de cartas e uma torre de blocos estilo jenga. A cada “rodada”, você vai rolar um dado e sacar um número de cartas igual ao valor sorteado no dado. Cada carta representa um problema para seu personagem resolver. Algumas cartas pedem que você puxe uma peça da torre para representar a tensão e a agonia que o personagem está vivendo e depois você anota no seu diário de bordo como seu personagem resolveu (ou não) cada um dos problemas que surgiram naquele dia. E daí começa um novo dia e uma nova rodada. Com o detalhe de que se a torre cair, a nave explode e você morre.
Como muitos jogos desse tipo, não há uma criação de personagem, então como fiz com o Global Dragon Egg Conservation vou fazer um pequeno gameplay desse jogo para vocês terem uma ideia de como funciona.

Dia 01
Cada dia é dividido em duas fases. Na fase um eu sorteio as complicações e tarefas do dia. Primeiro eu rolo um dado para ver quantas cartas/tarefas eu tenho no dia (e esse é um dos motivos pelo qual acho esse dado inútil). Eu rolo 1! Só uma carta para começar, ótimo. Sete de Espadas. Olho no livro para ver o que isso significa… A criatua de alguma forma sussurra para você através dos comunicadores da nave. Eu preciso puxar uma peça da torre. Peraí… Ok, feito. Eu descarto a carta e agora vamos para a fase 2 que é o diário.

Aqui é o Engenheiro Chefe do Cargueiro espacial Wretched, número de série 592951-D. *respira fundo* Diário especial. Dia um. Eu ainda não acredito em tudo que aconteceu nas últimas… horas, dias? Eu não sei. Foi tudo tão rápido e repentino que eu perdi a noção do tempo. Uma criatura alienígena invadiu a nave e atacou todos os tripulantes. Eu sou o último sobrevivente. Consegui colocá-la para fora da nave, mas de alguma forma eu sei que ela ainda está lá fora. Tentando achar uma nova brecha para entrar e terminar o serviço.
*Sobressalta* Vocês ouviram isso? Nos comunicadores? Uma voz metálica… dizendo que virá atrás de mim? Depois eu checo essa gravação para ver se não estou ficando louco…
Bom, o mais importante é tentar consertar a antena de comunicação para pedir ajuda e os motores pra sair daqui. Mas agora sou apenas eu e a criatura fez um senho estrago. Eu espero poder entregar essa mensagem pessoalmente para alguém, mas se o pior me acontecer…

Dia 02
Eu rolo 1 novamente. Parece que a sorte está do meu lado. Vamos ver até quando. A carta do dia é Três de Ouros. Eu passo horas consertando a janela do convés de observação por onde a criatura tentou entrar depois que a coloquei pra fora. Eu puxo uma peça na torre e anoto...

Diário Especial de Sobrevivência, Engenheiro Chefe do Cargueiro espacial Wretched, número de série 592951-D, Dia Dois! Ainda fazendo os reparos por onde a criatura passou. O convés de observação foi bem danificado. Ela tentou entrar por aqui depois que expulsei. Eu fico pensando o que a fez desistir. Está silencioso. O espaço é um silêncio constante e infinito. Ainda mais quando se está sozinho. Eu sei que ela está lá fora. Reforço a janela com algumas placas de alumínio transparente. Não quero usar todas para não ficar sem peças sobressalentes tão cedo.

Dia 03
Rolo um 6! Minha sorte não podia durar pra sempre, não é? Vamos tirar seis cartas:
01) Rainha de Paus: Limpar os corpos do local onde pretendo me esconder se a criatura entrar de novo. Tenho de puxar uma peça da torre.
02) As de Espadas. Encontro uma maneira de distrair a criatura.
03) Quatro de Paus. É um convite para refletir onde eu me escondi enquanto a criatura dizimava a tripulação.
04) A tranca das portas para a ponte travam e eu gasto tempo passando e consertando elas. Puxe uma peça da torre.
05) Dois de Espadas. Eu penso em desistir de tudo. Puxe uma peça da torre.
06) Valete de Copas. Eu gasto o dia fazendo manutenções básicas nos motores tentando pensar no que fazer a seguir. Puxe uma peça da torre.
Ao todo eu preciso puxar quatro peças da torre agora. Na verdade eu tinha de tirar uma de cada vez antes de revelar a próxima carta. Mas abri todas aqui só pra manter o exemplo.
Consegui tirar as quatro peças, apesar de a torre ter bambeado bastante na segunda e na terceira. Vamos agora tentar incorporar todas as cartas em um relato.

Diário Especial de Sobrevivência, Engenheiro Chefe do Cargueiro espacial Wretched, número de série 592951-D, Dia … Três?! Ao mesmo tempo parece tão pouco tempo e uma eternidade desde que as pessoas que eu amava e convivia por anos morreram de forma tão brutal. Eu me peguei conversando com o corpo flutuante de Sara no refeitório essa manhã e decidi que era hora de tirar os corpos daqui. Não sei se conseguirei dar a eles um enterro descente. Um pensamento passar rápido pela minha mente. De que em breve eu ficarei sem provisões… e antes que isso siga um raciocínio por onde eu não me atrevo a seguir eu jogo os corpos do refeitório no espaço. As portas da ponte ficam dando problema e eu passo boa parte da tarde consertando-as. Manhã, tarde, dias… o tempo vai perdendo o sentido em meio a essa solidão no vazio estelar. Minha mente fica flutuando, pensando em como tive sorte de me trancar perto do reator quando a criatura atacou e se mereço tamanha sorte. O que eu tenho de especial para estar vivo enquanto Sara e os outros agora flutuam na imensidão do espaço? Eu me peguei pensando que talvez lá seja o meu lugar, lá fora, junto com eles, para que a criatura termine o que começou… Eu tento desviar meus pensamentos fazendo pequenos consertos nos motores e isso me dá uma ideia. Talvez eu precise de algo para distrair a criatura quando ela voltar a entrar, preciso pensar em algo para isso.
Suplemento: Percebo que em minha última colocação eu disse “quando” e não “se” a criatura entrar. É como me sinto. Eu não posso vê-la, mas sei que está lá fora, procurando uma brecha. Talvez ela tivesse aproveitado quando lancei os corpos hoje. Talvez foi por isso que os joguei. Por achar que eu mereço esse fim.

Dia 04
Tirei um 2! Talvez minha sorte tenha voltado. Vamos as cartas.
01) Rainha de Espadas – Como eu imagino que a criatura chama a si mesma? Puxe uma peça da torre.
02) Valete de Ouros – Eu perco energia por toda a nave, consigo consertar sacrificando parte da energia de backup que eu não vou poder recuperar. Puxe uma peça da torre e não a coloque no topo. Retire-a do jogo.
Deixa eu tirar as peças…
Ufa! Pensei que dessa vez ia cair. Foi por bem pouco.
Vamos ao relato:

Cof! Cof! Aqui é Engenheiro Chefe do Cargueiro espacial Wretched, Cof! Cof! Diário Especial de Sobrevivência, Dia Quatro ou Cinco porque já passou da meia-noite. Hoje eu fui acordado por uma série de alertas por toda a nave. Parece que tudo resolveu dar problema ao mesmo tempo. Estou a mais de vinte horas acordado.O corpo todo dói. E eu nem lembro a última vez que comi ou bebi alguma coisa… e estou cansado demais para fazer isso agora.

Será que alguém vai ouvir essa merda um dia? Ou será que eu e meus amigos vamos apenas cair no esquecimento? Uma estatística nos acidentes espaciais… merda! Estou cansado de chorar nessa merda!

Pouco antes dos alertas me acordarem… eu estava sonhando com a criatura. Ela me disse seu nome. Sharapanel! Também me disse que era um anjo que veio limpar o universo. Talvez isso seja o que somos. Um bando de sujeira.

Último registro da nave cargueira Wretched, perdida a duzentos anos no espaço interestelar entre Tau Ceti e Sol.


Bom, gente, a torre caiu. Precisei de um espacinho na mesa onde ela estava para jantar, fui movê-la devagarinho e como ela já estava instável, caiu. Eu também já estava pensando se esse post já não estava ficando grande demais, pra falar a verdade. Mas espero que tenham gostado. Tenho outros dois jogos desse sistema para postar aqui e acredito que serão posts da mesma forma. Fora isso, espero que tenhamos um 2025 melhor que o destino do nosso sobrevivente engenheiro.

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